Câncer do colo do útero
No Brasil, excluídos os tumores de tumores de pele não melanoma, o câncer do colo do útero é o terceiro tipo de câncer mais incidente entre mulheres. Para o ano de 2021, são esperados 16.710 casos novos, com um risco estimado de 15,38 casos a cada 100 mil mulheres (INCA, 2021).
O Câncer de colo uterino é causado pelo vírus do papiloma humano (HPV) quase em 100% dos casos. Esta infecção acomete a maioria das pessoas, que tem relações sexuais, em algum momento da vida. A infecção pelo HPV normalmente é um infecção transitória, ou seja, as pessoas se infectam pelo vírus e conseguem elimina-lo do seu organismo. Quando não eliminam, conseguem manter o vírus em um estado latente, sem que cause qualquer lesão na genitália.
Existem vários tipos de HPV já identificados (cerca de 200 tipos), sendo que mais de 40 delestem preferência pelo trato genital. Nesse grupo de HPV temos os oncogênicos, que podem causar alterações pré cancerosas e câncer. Os subtipos16 e 18 sãoconsiderados os mais importantes, pois são responsáveis por cerca de 70% dos cânceres de colo uterino.Dentre ossubtipos não oncogênicos, os HPVs 6 e 11 são os mais comuns, habitualmente causam lesões verrucosas na genitália.
Na história natural da infecção por HPV oncogênicos, observamos normalmente 3 cenários:
- Na imensa maioria temos a infecção pelo vírus sem desenvolvimento de nenhuma lesão genital visível a olho nu e sem necessidade de nenhuma conduta, exceto a observação.
- Em uma pequena parcela das mulheres podemos observar lesões genitais através do exame de Colposcopia, sem que a paciente tenha qualquer sintoma e que frequentemente, cerca de 60 a 70%, desaparecem espontaneamente no decorrer de 1 a 3 anos, sem necessidade de tratamento.
- E por último, temos um percentual mínimo de mulheres, não mais que 1%, que podem persistir com a infecção por HPV oncogênico e as lesões apresentarem evolução para lesões mais importantes, chamadas de lesões pré invasivas ou pré cancerosas. Essa evolução, quando acontece, é muito lenta e assim temos tempo suficiente para detectá-las e tratá-las, antes que se transformem em câncer invasor.
Diante dessas informações podemos ver que o câncer de colo uterino é uma doença totalmente evitável, desde que façamos a prevenção adequada. Temos a prevenção primária, feita através da Vacina HPV, que protege contra a infecção pelos HPV 16 e 18 e temos a prevenção secundária, através do rastreamento. No rastreamento podemos identificar as alterações pré cancerosas e realizar o tratamento adequado, evitando que o câncer invasor se instale.
Em final de 2019 a Organização Mundial de Saúde (OMS) lançouum desafio ao mundo de “2030 sem Câncer de colo uterino” e para isso deseja que nos esforcemos para fazer a Vacinação contra HPV de pelo menos 90% das meninas de 14 e 15 anos, que façamos rastreamento de pelo menos 70% das mulheres entre 35 e 40 anos e que possamos tratar pelo menos 90% das mulheres que forem identificadas com alterações pré cancerosas ou cancerosas nos Serviços de Saúde. É uma meta muito ambiciosa, mas que nos incentivapara melhorarmos cada vez mais nossos Serviços de Saúde, sejam eles Públicos ou Privados.
No Brasil ainda temos a recomendação do INCA/MS do uso do Exame de Papanicolaou ou Colpocitologia como exame de rastreamento, mas tanto a OMS como várias Sociedades de Ginecologia pelo mundo, inclusive a nossa no Brasil (FEBRASGO), já recomendam o uso do Teste de DNA HPV no rastreamento, como método mais eficaz na detecção das alterações pré cancerosas e assim capaz de diminuir a morbidade e mortalidade pelo câncer de colo do útero.
Risco de ter câncer do colo do útero?
Aproximadamente 300 milhões de mulheres no mundo são portadoras do HPV, sendo que 32% delas estão infectadas pelos tipos 16, 18 ou ambos, os mais importantes causadores do câncer. A incidência mundial anual de câncer cervical é de aproximadamente 500 mil casos novos, ou seja, o câncer de colo uterino é um evento ainda bastante raro, quando consideramos o número total de pacientes infectados pelo HPV no mundo.
Associado à infecção por HPV, devemos considerar ainda fatores como o cigarro, o início da atividade sexual precoce, fatores ligados à baixa resposta imunológica, múltiplos parceiros sexuais e outras DST, como fatores de risco importantes na gênese do câncer cervical, levando a persistência e progressão das alterações HPV induzidas.
Como evitar o câncer do colo do útero?
A detecção das alterações precursoras do câncer no colo uterino é fundamental, pois a identificação destas alterações e o tratamento em tempo hábil, evita totalmente o câncer invasor de colo. Esta deteccão é feita através do exame de Rastreamento. Este exame é feito após início da atividade sexual, em pacientes acima de 25 anos e pode ser colhido em qualquer serviço de Ginecologia, por médicos ou enfermeiros capacitados.
Como o HPV se manifesta e como descobrir ?
A maioria das pessoas com HPV é assintomática. Tanto o homem quanto a mulher podem ter HPV e não apresentar nenhum sintoma. Como normalmente as manifestações pelo HPV não são vistas a olho nu, é comum as pessoas terem lesões por HPV e não saberem, mas estão transmitindo quando tem relações sexuais.
A infecção por HPV pode se apresentar em diferentes formas:
- Latente – existe a infecção pelo vírus, mas sem sintomas e sem nenhuma manifestação detectável, somente a identificação do vírus em exames laboratoriais, conhecido como Teste de DNAHPV;
- Subclínica – existe o HPV, ele está se manifestando, mas as manifestações não são vistas a olho nu. Estas manifestações podem ser suspeitadas em exames de Papanicolaou e serão vistas em exame de Colposcopia, com aparelho com lentes de aumento, filtros de luz e uso de soluções reagentes.
- Clínica – existe o vírus e este está se manifestando em forma de lesões verrucosas, chamadas condilomas genitais, que podem aparecer em pênis, vulva, períneo, pêlos, vagina e colo uterino e que normalmente são causadas pelos HPV 6 e 11, considerados não oncogênicos.
Assim sendo, quando não vemos lesões genitais, não é possível garantir que o HPV não está presente.
As alterações subclínicas em colo uterino são identificadas na Colposcopiaquandousamos a solução de ácido acético e fazemos o teste de Schiller. Essas alterações são avaliadas pelo Colposcopistae a depender do grau de comprometimento do tecido podemser somente acompanhadas ou tratadas. Essas alterações são conhecidas como Lesões Intra Epiteliais (LIE) de colo uterino, de baixo ou de alto grau.
Como tratar o HPV?
Como nas outras infecções virais, não há tratamento específico para o vírus. Faremos o tratamento das lesões condilomatosas/verrugas, que será individualizado, dependendo da extensão, número e localização. Podem ser usados eletrocauterização, Cauterização química, com o uso de ácido tricloroacético (ATA), Laser e medicamentos que melhoram o sistema de defesa do organismo.
As lesões subclínicas (Lesão intra epitelial de baixo grau/NIC I) não oferecem maiores riscos, tendendo a desaparecer mesmo sem tratamento na maioria das mulheres. A conduta recomendada é o acompanhamento dos casos.
O tratamento apropriado das lesões precursoras (Lesão intra epitelial de alto grau/NIC II/III) é imprescindível para a redução da incidência do câncer do colo do útero. O tratamento normalmente é realizado com a retirada da área alterada, que pode ser feito por cirurgia clássica com bisturi frio ou mais comumente por Cirurgia de Alta Frequência – um bisturi elétrico com possibilidade de cortar e cauterizar ao mesmo tempo, com sangramento menor e feito em ambiente de consultório, sem necessidade de internação, sob anestesia local e muito bem tolerado pelas pacientes.
Após o tratamento é essencial o acompanhamento para detectar as possíveis persistências de lesões ou reaparecimento das mesmas.
Como é a transmissão do HPV?
A transmissão do vírus se dá por contato direto com a pele ou mucosainfectada. A principal forma é pela via sexual, que inclui contato oral-genital, genital-genital ou mesmo manual-genital. Assim sendo, o contágio com o HPV pode ocorrer mesmo na ausência de penetração vaginal ou anal.
Como a maioria das pessoas com HPV são assintomáticas, a transmissão sexual ocorre sem que os envolvidos saibam, daí ser tão comum a infecção por HPV. Estudos comprovam que 80 a 90% das mulheres sexualmente ativas serão infectadas por um ou mais tipos de HPV em algum momento de suas vidas. Porém, a maioria das infecções são transitórias, sendo combatida espontaneamente pelo sistema imune, regredindo entre seis meses e dois anos após a exposição, principalmente entre as mulheres mais jovens.
Também pode haver transmissão durante o parto e não está comprovada a possibilidade de contaminação por meio de objetos compartilhados.
Na suspeita de contato com HPV, basta manter seus exames de rotina. As manifestações serão vistas em algum momento, se surgirem, e só então serão tomadas as medidas necessárias. O uso de Preservativo é muito importante para evitar a transmissão, considerando que a maioria das lesões por HPV estão nas áreas de proteção da camisinha, mas sabemos que a proteção não é 100%. Devemos considerar ainda a importância do uso do Condom na prevenção das outras DSTs.
Vacina anti HPV – o que preciso saber?
Atualmente temos duas Vacinas anti HPV profiláticas disponíveis e aprovadas pela ANVISA no Brasil, sendo uma conhecida como quadrivalente (contra HPV 16, 18, 6 e 11) e outra como bivalente (contra HPV 16 e 18).
Ambas as vacinas se mostram muito eficazes na proteção contra as infecções pelos HPV nelas contidas. A recomendação são 3 doses, intra-muscular, a partir dos 9 ou 10 anos até 45 anos. Recentemente foi aprovado o uso da vacina bivalente sem idade limite.
A inclusão dos HPV 6 e 11 na vacina quadrivalente levou a uma proteção também contra as lesões condilomatosas e não somente contra as alterações precursoras do câncer de colo uterino, causadas principalmente pelos HPV 16 e 18.
As vacinas devem sem aplicadas preferencialmente nas meninas que ainda não iniciaram suas atividades sexuais, pois apresentammelhores resultados. Não há, até o momento, evidência científica de benefício estatisticamente significativo em vacinar mulheres previamente expostas ao HPV. Isso quer dizer que algumas mulheres podem se beneficiar e outras não. Nesses casos a decisão sobre a vacinação deve ser individualizada, levando em conta as expectativas e a relação custo-benefício pessoal.
A Vacina HPV, quadrivalente, está disponível na rede pública de saúde do Brasil para meninas de 9 a 14 anos e para meninos de 11 a 14 anos.
Nenhuma das vacinas é terapêutica, ou seja, não há eficácia contra infecções ou lesões já existentes. As vacinas são altamente seguras, praticamente sem efeitos colaterais, exceto das reações locais pela injeção e os dados já nos mostram que em 13 anos não é necessário dose de reforço, mas ainda em observação por ser uma vacina nova.
É fundamental que as mulheres vacinadas continuem com seus exames de Rastreamento de rotina, visto que os HPV 16 e 18 são responsáveis por cerca de 70% das lesões precursoras do câncer cervical somente. Vale a pena lembrar também que a continuação do uso do preservativo é essencial para evitar contaminação de outras DSTs.